quinta-feira, 3 de outubro de 2019

QUEM BATE?


Essa história aconteceu de verdade com um acadêmico da UFFS.
                Em meio a provas e trabalhos, é preciso ter uma grande organização para conseguir fazer todas as tarefas que os professores pedem, sem desagradar a nenhum. Compreende-se que cada professor imagina que a sua matéria é a mais importante e a que melhor formará seus alunos, mas é preciso ter em mente que, junto com ele, outros professores pensam exatamente assim e julgar os alunos como exclusivos seus e com dedicação total aos seus conteúdos é algo complicado...
                Por isso, quando o professor deu o recado de que o trabalho final do semestre deveria ser entregue em mãos, sem falta, até as 15 horas do dia 18 de dezembro, na sua sala do bloco dos professores, a turma engoliu em seco. Todos estavam meio pendurados, todos teriam de fazer e entregar. Mas um aluno, perdido em pensamentos de outra matéria, não processou a informação.
Os dias passaram, os trabalhos foram sendo entregues. Menos o dele.
Quando faltavam dois dias, ele pegou uma gripe e caiu de cama. Então, um amigo o visitou e comentou: “Que chato, pelo menos já é final do semestre. E o trabalho do professor já foi entregue”. Entre espirros, o aluno fez uma cara de espanto: “É verdade... Falta fazer isso. Mas até quando que dá para entregar?”, “Depois de amanhã”. Poucas vezes o desespero conseguiu ser personificado tão intensamente por uma pessoa. Sem saber o que fazer, como sistematizar as ideias, mesmo com o corpo baqueado pela doença, tomando chás e água, medicamentos e calmantes, o aluno tentou produzir o que seria satisfatório ao professor. Sabia que dizer que estava doente não ajudaria em nada, pois já era véspera de fim de semestre, e a última coisa que o professor faria era entender o seu lado da situação. Era simples, ou o trabalho estaria em suas mãos para a correção, ou não. Ou o aluno seria aprovado, ou não.
Com custos só compreensíveis para ele, conseguiu finalizar na manhã do dia 18. Lá fora, o mundo desabava em tempestade, a água descia em baldes, batia nas janelas e o vento uivava por todas as frestas. Trovões se ouviam por toda parte. Como levar o trabalho? Os colegas todos já tinham viajado. Não tinha dinheiro para pagar um táxi. Não havia pessoa a recorrer. Sem pensar direito, pôs o trabalho num saco plástico e teve de ir a pé. Pois já eram 14 horas.
Todo o caminho até a UFFS foi feito sob a ação do vento, ora empurrando, ora puxando, arrastando o aluno enquanto pisava em poças de água e barro, escorregava em pedras e tentava se proteger debaixo de um frágil guarda-chuva com cinco hastes quebradas.
Chegou na universidade tossindo e pingando, tremores por todo o corpo, mas com o trabalho seco. As luzes do saguão estavam apagadas, pois não havia ninguém ali. Os servidores estavam numa reunião de encerramento do ano letivo no outro bloco. Com passos de um esgotamento vitorioso, foi até a sala do professor. Deu três tímidas batidas na porta, num ritmo lento e inseguro (toc... toc... toc...) Não houve qualquer resposta.
Olhou em seu relógio, eram 15 horas exatas. O professor deveria estar ali ainda, para que pudesse receber o seu trabalho, feito a tanto custo. Bateu novamente, três batidas curtas, ainda com certo receio, como se desejasse ser uma presença que se quer mostrar sem incomodar. Pensou em jogar o trabalho por debaixo da porta, mas o professor falou “em mãos”, então ele poderia reprovar justamente por não ter o olhar comprobatório da entrega concreta.
Decidiu bater uma terceira vez, dessa vez com um pouco mais de força, mas ainda com o respeito que só existe quando o medo impera, mesmo sem a presença do ser temido. Nenhum som foi ouvido no lado de dentro.
Torceu sua camisa encharcada, fazendo uma grande poça na porta do professor. Pensou no que faria. Esperar ali talvez não fosse a melhor opção, especialmente porque um vento frio passava pelo corredor, dando-lhe calafrios. Melhor seria achar outra pessoa, outro professor, para mostrar-se e ser uma testemunha de que ali estava. Foi até a porta vizinha, bateu três vezes e aguardou. Também não houve qualquer sinal de vida. Bateu em outra. E outra. E mais outra.
Uma tosse aguda fez com que todo o seu corpo tremesse e arqueasse seu corpo para a frente. Sua mão segurou a parede, para evitar que caísse no chão. Virou-se e, pouco a pouco, seu corpo deslizou até que ficou sentado no chão. Descansaria ali um pouco, para recuperar as forças enquanto esperava o professor.
Cerca de uma hora depois, quando os servidores voltaram ao bloco, encontraram o rapaz desmaiado, com grande febre e em convulsão. Levaram-no ao hospital, mas o quadro de pneumonia já estava muito agravado. Ainda ficou internado por dois dias, antes de falecer.

Essa história aconteceu de verdade com um acadêmico da UFFS.
No meio do tumulto para levá-lo ao hospital, os seus papéis acabaram se perdendo. Mas já houve relatos de professores que, fechados em suas salas, ouviram, muito de leve, três batidas na porta. Pode ser ainda o aluno buscando o professor para entregar-lhe o trabalho.

segunda-feira, 23 de setembro de 2019

ARMÁRIO A115


            Essa história aconteceu de verdade com uma estudante de Nutrição da UFFS.
            Não havia tempo. A rotina era intensa, com as aulas terminando muito perto do meio-dia e recomeçando um pouco depois da uma da tarde. Conseguir um transporte até o seu apartamento no centro e voltar era algo muito próximo de um milagre. E, mesmo que alguém fizesse esse favor, ela ainda teria de cozinhar, lavar a louça, enfim, muitos serviços.
            Melhor mesmo era almoçar no Restaurante Universitário, logo ali ao lado. Muito mais prático e rápido. E a velocidade das coisas sempre foi uma coisa que ela buscava. Não se tinha tempo a perder, cada segundo devia ser dedicado a alguma atividade, pois podia ser que fizesse falta mais tarde. “Sempre tenho o que fazer da meia-noite às seis”, “Hoje fui dormir às quatro da manhã, consegui estudar muito”, “Descansarei quando morrer” eram frases que dizia constantemente, como se ela fosse uma coach de si mesma.
            Naquele dia, no Bloco dos Laboratórios 3, mal a professora dispensou a turma, a moça pulou da cadeira e correu para os armários no corredor. Abriu o armário A115, agarrou sua mochila, tirou um caderno e a recolocou, nem se dando ao trabalho de fechar a porta. Esbarrou em algumas colegas e outras pessoas que estavam por ali, paradas, como se à espera de qualquer coisa. Queria comer logo, não por estar com fome, mas porque queria revisar a matéria da semana anterior, que mal teve tempo de ler. Só conseguiu ler uma vez a bibliografia básica que o professor mandou, ainda faltavam dez livros que precisava fazer anotações e memorizar para a prova que seria no mês seguinte.
No caminho até o RU, foi lendo o que escreveu em seu caderno. Durante o almoço, praticamente sem mastigar a comida, foi ouvindo uma gravação que fez da aula (com o consentimento da professora, claro). Subiu as pedras de volta para o laboratório, gravando um áudio para si mesma com lembretes para estudar à noite, quando chegasse em casa.
Era meio-dia e vinte quando novamente entrou no corredor. Dessa vez, sem ninguém à vista. As luzes estavam apagadas, pois era dia, o que dava uma sensação estranha, pois as únicas fontes de luz estavam nas duas extremidades do corredor. Andando, ela avançava nessa área de penumbra, até que o próprio eco dos passos parecia tomar conta de tudo. Todas as portas dos armários estavam fechadas, as chaves ainda estavam em alguns, mas dificilmente eram usadas. Dos outros, possivelmente elas foram perdidas, então mantinham-se destrancados.
A moça passou a mão distraída pelas portas dos armários e segurou a alça do seu. No instante antes de abrir, sentiu um calafrio de premonição, como contaria depois, mas na hora a intenção era abrir a porta e pegar seus materiais. E então, abrindo a porta, sentiu uma lufada de ar vindo do interior do armário. Estendeu a mão para pegar sua mochila, mas logo ficou imóvel. Lá dentro, dois pequenos olhos vermelhos brilhantes a encaravam. Piscou os olhos e até pensou em fechar a porta, mas o bicho no interior foi mais rápido. Ouviu apenas um “vuuu” do golpe de vento que balançou seus cabelos e o choque de algo mole e peludo em seu ombro.
O bicho tinha asas, e foi voando de modo desengonçado até a porta de vidro nos fundos do laboratório. Bateu-se na parte de cima, e suas asas quase tocavam, ao mesmo tempo, as extremidades do vidro. Soltou um grasnido triste, caiu no chão e se arrastou para fora. A moça estava encolhida junto ao bebedouro, mas espiou o que estava acontecendo ali junto à porta de vidro.
Tomando nova impulsão, o bicho conseguiu levantar voo até o telhado da Central de Reagentes. De lá, deu um salto e flutuou até a mata que levemente balançava com a brisa da tarde.


            Essa história aconteceu de verdade com uma estudante de Nutrição da UFFS...
            Depois disso, ela não quis mais fazer nada afobada. Passou a realizar todas as suas atividades num ritmo mais próximo das outras colegas, conscientemente vendo cada coisa que estava fazendo e prestando muita atenção no que acontecia ao seu redor. Além disso, seguindo as recomendações no manual dos laboratórios, ela passou a usar somente armários com chave. E conferir três vezes se a porta estava trancada.

terça-feira, 27 de agosto de 2019


REGULAMENTO CONCURSO DE CONTOS
"ACONTECEU DE VERDADE" - LENDAS URBANAS DA UFFS

1.    O Concurso de Contos se destina a todas as pessoas interessadas em produzir narrativas enquadradas no gênero “conto”. A inscrição é gratuita.
2. Consideram-se inscritas as obras enviadas para o e-mail lendasurbanasuffs@gmail.com, no período de 25 DE AGOSTO A 31 DE OUTUBRO DE 2019.
A narrativa deverá ser escrita em língua portuguesa, digitada em espaço 1,5 (um e meio), com fonte Arial, tamanho 12 (doze), margens 2 cm, paginada, obedecendo a um limite máximo de 05 (cinco) páginas e salva em Microsoft Word (.doc ou .docx). O nome do arquivo deve seguir a diretriz:
Nome do Autor - TÍTULO DA NARRATIVA;
3.    A temática deste Concurso é "Lendas Urbanas da UFFS". Nesse sentido, devem ser criadas narrativas que versem sobre seres e/ou eventos sobrenaturais que aconteçam no âmbito dos espaços do Campus Realeza da Universidade Federal da Fronteira Sul - UFFS.
4.    A narrativa deve começar com a seguinte frase: "Essa história aconteceu de verdade com um(a) (estudante, professor(a), técnico(a), visitante) da UFFS";
5.    Não há limite de narrativas por pessoa;
6.    A Comissão Julgadora será composta por membros de reconhecido nível intelectual e acadêmico;
7.    Havendo sugestões de adequação das narrativas, a Comissão devolverá o arquivo ao Autor, no sentido de adaptá-la visando a uma coerência entre todas as narrativas inscritas;
8.    Narrativas que não se adequem ao regulamento serão desqualificadas.
9.    Todas as narrativas inscritas, após as adaptações necessárias, comporão o e-book "Aconteceu de verdade" - Lendas Urbanas da UFFS, a ser publicado em 2020 pela Editora da UFFS;
10.Dúvidas, favor entrar em contato pelo e-mail lendasurbanasuffs@gmail.com